segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Na varanda

"Nosso remanso perfumado de doces canções
Repleto de amor no fim de tarde
Que se vai passando ao ritmo da melodia tanta
Até a luz baixa refletir vagarosa e sincera
A cumplicidade dos sorrisos abertos
Esquecidos frente a frente
Como a regar as plantas de breve felicidade."


quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Há algum tempo

"Ei de confessar-te um segredo
Em frases simples, sem medo e sem métrica
A despeito de teu ceticismo

Desejo violar esse ponto insistente
Ameaça iminente de um fim sobre meus versos
De interrupção prematura da estrofe
Que nos selaria então as portas da vida

Ao contrário do que escreveu Neruda
O teu riso não mais veria passar pela avenida
Trazendo consigo a magia que conheço bem
Mas que definha a cada dia um pouco mais
Pela distância dos caminhos que nos separam
Dos poemas que se calam teimosos,
Relutantes em desatar o nó e o silêncio

Ei de confessar então, senão agora, jamais
Nunca ser demais o recordar dos momentos
Em que ainda me era dado amar-te
Desvestido destas vestes de inútil dissimulação
De cartas endereçadas a ti sem resposta,
E da solidão dos domingos na praça
Enrijecido pela hora que não passa
Estagnada diante de mim à tua espera

Infinita na demora de trazer-te novamente
Ao alcance dos meus olhos exaustos,
Ao tatear cego de minhas mãos ansiosas
Que só fazem lembrar de tua ausência

Sempre presente, permanente e sincera 
Como uma criança a dormir
E desfrutar de sonhos coloridos,
Repletos de inocente alegria
Tal qual fomos um dia
Há algum tempo atrás."

Satisfação

"Passam-se os dias
Perdem-se as horas
Vazias como o silêncio
Neste imenso litoral
Onde paro a observar o mar
E sua sequência infindável de ondas
Transformar-se em espuma branca
Sob meus pés descalços
Enchendo-me de uma agradável sensação
Estranha satisfação de estar vivo
Completo, do vento às marés
Dos pássaros que gorjeiam alto
Até a calada solidão em meu peito
Completo enfim,
Mas ainda assim insatisfeito."

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Ninguém

"Ninguém será capaz de perceber
Que o sofrer de outro alguém
Não importa quem,
Não importa o quanto
Foi, é e para sempre será
Parte dele também
Parte do canto silenciado
Nas gargantas de toda a gente

Ninguém será capaz de ver,
Reconhecer no outro a si próprio
Antes que seja tarde demais
Antes que o revés da vida
E suas feridas fatais
Marquem para sempre a história
Com páginas de tristes recordações
De existências perdidas em vão
Sobre o solo duro de concreto

Cálidas ainda, ofegantes 
Sob a fina garoa de verão
Que cai incessante, impaciente
Ensopando tudo ao redor
Confundindo o suor dos corpos
No esgoto de escuras avenidas
Abandonadas com seus cadáveres a feder

Sem ninguém ver,
Sem ninguém jamais saber dos mortos
Senão por apenas ouvir dizer que existem
E seguem famintos pelo mundo afora
Distantes de todo o glamour
Ausentes de qualquer conforto
Invisíveis talvez ao olho nu dessa gente

Gente que passa depressa, tropeça, desvia
Indiferentes como a chuva
Que molha sem querer nossa cidade
Nossa grandiosa metrópole corrompida
De vaidades sem limites,
Crescentes como o sol nascente
Que se ergue por detrás dos arranha-céus
Sem sequer alcançar os homens

Sol cujo lume não aquece mais o frio,
Nem nos ofuscam os olhos
Luz que a gente esquece
Porque por vezes parece
Haver se cansado de brilhar por nós

O que faremos?
O que seremos quando a escuridão reinar?
Quem será capaz de saber
Se o mundo será melhor então
Sem conhecer suas próprias desgraças?

Escondidas no breu das ruas
Debaixo de cobertas imundas
Cercadas por matilhas de cães vadios
Que não farão senão uivar para a lua
Eternizada no infinito como doce lembrança
Daquilo o que perdemos no passado
Da humanidade apodrecida em nossas mãos
Da vida dilacerada pelo tempo,
Em pequenas partes de amarga desilusão."

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Falando aos mortos

"Suas frágeis mãos agora ainda mais magras aparentam qualquer coisa contrária à vida, à vitalidade com que me recordo vê-la andando pela casa, a preparar o café da manhã de cereais, café preto e pão francês na manteiga. Seu lar agora é um leito solitário cercado por aparelhos amedrontadores, de toda a tecnologia existente e capaz de tornar quase imperceptível a aproximação do fim.

Gotas preguiçosas despencam de uma bolsa transparente, escorregando vagarosamente por um tubo longo e sinuoso, direto para suas veias ressequidas, incolores. Sinto pena, e me culpo por isso também. Pergunto-me por que um ser humano reconhece a humanidade do outro somente pela dor, em vão. Não tenho resposta, ela não me escuta, desvia os olhos pequenos e sem brilho para o outro lado, distantes da dura realidade de silêncio e espera.

Seus movimentos são agora apenas lembranças em um corpo cujos músculos retesos não esboçam qualquer tentativa ou frustração. Nenhum lamento se vê por estar condenada a aceitar a vida como ela se apresenta.

Viro as costas e caminho com os ombros pesados até a porta. Surpreendo-me com a mente descansada, sem pensamentos, mas um pouco triste. A morte é mesmo das coisas mais feias que já vi."

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Um dia

"Um dia quando o tempo passar
E a paixão esfriar,
E os corações secarem sob o sol
Como folhas caídas no outono
Um dia quando não houver mais nada,
Nenhum sopro de esperança em nossas almas
Ou palavras de consolo a dar
Se nenhuma promessa restar
Ainda por ser esquecida nas horas de solidão
Neste dia acabará o antes e o depois de nós,
Nada haverá.
Nada de que se arrepender ou lembrar
As tardes perderão a luz,
Os sorrisos enferrujarão sem graça
Em faces desconhecidas e pálidas
Com seus pares de olhos cinza a mirar o chão
Como que a procurar nas frestas
Qualquer sinal de recordação,
Qualquer pequena lembrança.
Quando o dia chegar, meu amor
Quero apenas vê-la passar uma última vez
E gritar, gritar o mais alto que puder
Antes que o silêncio aconteça
E nos cale para sempre."