domingo, 2 de novembro de 2014

Cogitatio

"Talvez nada tenha valido a pena,
pois minh'alma pequena 
não fora suficiente.
Talvez tudo tenha sido um desperdício
do tempo que não tenho,
da vida que não gozo,
da felicidade que me abandona.
E meus sonhos, todos eles
podem ter sido somente alucinações
de um sonhador compulsivo
de um jovem inexperiente
ou de um ser humano sedento de vida.
Pouco me importa isso agora:
vivi e sou grato;
errei e sou um pouco triste;
amei e fui completo por alguns instantes.
Isso é tudo."

sábado, 20 de setembro de 2014

Temeridade

"Alguma coisa sempre fica 
por explicar,
por definir,
por se constituir definitivamente
enquanto matéria.

Neste caso,
temo eu ser tal coisa."

domingo, 27 de julho de 2014

Elegia

"Choras a ausência, o horizonte vazio de ideais repetido dia após dia
tuas crenças fixaram-se em cada fração de existência cotidiana
por isso parece-te lícito bradar feito um animal raivoso
apontando na multidão os culpados da desgraça humana
os inimigos da ordem e da civilidade forjadas a tanto custo
no silêncio de alcovas colossais,
em tribunais cuja imensidão desconhecemos completamente.

Negas o pecado que cometestes,
pois é certo que ignoravas tão bem a verdade
e que teu porto seguro sempre foste a virtual hipocrisia
na qual entretêm-se os homens ao redor do mundo caduco
de onde escrevo a elegia de uma vida que lhe pertencera outrora.

Tu falavas de um Deus no qual não cria,
do ser justo e piedoso que não se via em teus gestos
ou no brilho oculto dos olhos que me deram a dádiva da escolha,
para enfim discordar das tuas premissas e certezas
e quiçá acordar-te do sono secular que mutila a nossa natureza.

Confesso que gostaria de sentir falta de algo,
de um insignificante momento, e por isso choro 
e nego a cruel possibilidade de que nada tenhas deixado
além de lembranças para um poema ruim."

quarta-feira, 16 de julho de 2014

Noite vermelha

"Existe atravessado em mim
oco e inconfundível
o traço de um triste presente
queimando em chamas,
ardente
projétil da intolerância
estilhaços da bomba caótica
que tingiu o breu do céu
e tantas vidas inocentes
de vermelho
pela eternidade."

quarta-feira, 2 de julho de 2014

Gold Coast

"Amigo, sei que estás de partida
É noite e meu coração palpita
Incessantemente em meu peito
Sabe que está vivo e tem sede
Impossível seria não lhe dar ouvidos
Me parece cheio de belas novidades
Cheio do simples, do óbvio, prazer
Ocultado pela inexperiência
Ou pela vil estupidez humana
Da qual não estamos imunes

Já sabemos que em Outubro partirás,
Mas nos agrada imaginar que ainda assim
Estarás conosco sempre presente
Somos como aqueles
A quem tua partida entristecerá um pouco
Não o suficiente para deprimir,
Mas o bastante para saber
Que um grande amigo se vai
Em busca da felicidade,
Daquilo que lhe preencherá tão bem
Como café quente no bule pela manhã

Sei que tudo isso não passará,
Enquanto não me ligares novamente
Com a gargalhada alegre de sempre
Mas sei também de mais
Que este aperto que tu também sentes
É o prelúdio de dias melhores,
De sonhos construídos e executados,
Frutos do teu grandioso espírito
Mas, sobretudo,
Que representa uma simples amizade
A quem tua presença fará falta,
Saiba disso

Se escrevo é porque estou feliz
Em parte, devido à tua felicidade
Em parte, porque sei que voltarás
E terás muitas histórias
Para nos ocupar o tempo
Pode ser que estejas mudado,
Com mais barba ou careca,
Com um cavanhaque estranho
Imitando a moda antiga
E isso igualmente nos renderá grandes risadas,
Tenho certeza!

Tenho pensado um bocado
Sobre as idas e vindas,
Sobre como as pessoas se deslocam
Ou se sentem deslocadas
Quanto imaginamos que estão bem
E acredite no que vou lhe dizer rapaz:
Não tenha medo de viver!
Faça o que acha que tem que ser feito
E aceite as consequências
Como um aprendizado sadio
E por vezes doloroso

E onde quer que estejas,
Lembre-se que tudo o que você precisa
Não foi levado nas infinitas malas,
Nem está reservado em um quarto de hotel
Ou em uma pensão barata
No subúrbio de Gold Coast
Lembre-se, antes de mais nada,
Que lhe digo isso em prece
Para que a tua luz nunca se apague
Nos momentos de maior necessidade

Onde quer que estejas, de hoje em diante,
- Quero que me prometa que não se esquecerá -
Atinja a felicidade que o habita
Aquilo que jamais poderás encontrar
Em lugar outro que não seja dentro de ti
Saiba ser feliz com aquilo que tens,
Dar valor a tudo o que o preenche
Ainda que sejam as menores coisas
Um bom dia, o ar que respiras,
As boas recordações
Ou a fé que o movimentará
Em tua nova e audaciosa jornada

Tu nunca serás completo, meu caro,
Sinto em lhe dizer
E sendo assim, o que posso lhe deixar
De valioso e sincero
Como presente de boa viagem
É este simples conselho
E os renovados votos de uma amizade
A qual distância alguma apagará."

quinta-feira, 22 de maio de 2014

Sensações

"Tenho sede de ti,
Fome de ti
Quero que sejas
Não meu alimento desesperado
Tão pouco minha redenção
Mas antes a gota d'água libertadora
Fresca, transparente
Inevitavelmente passageira."

Descoberta

"Delineio tuas margens
Macias como algodão novo
Buscando em tua pele morena
Sinais do amor recém chegado,
Do suor ainda ardente
Confundido na beleza dos corpos
Entrelaçados desde o amanhecer
E para sempre."

Enigma

"Mulher, enigma meu
Ilha virgem de mel
De sal
E beleza
És tão inquietantemente envolvente
Quanto ousei imaginar
No auge de minha solitária incerteza."

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Ai de mim

"Sinto meus cabelos ralos
Minha alma carregada
A garganta apertada
Num nó que não se desfaz
Por nada
A gota d'água delirante
Que trará o fim
Do mundo
Aproxima-se também
De mim
Preocupado demais
Com a velhice ainda distante
Pesando toneladas
Em ombros ainda tão
Sadios
Ai de mim..."
 

quarta-feira, 19 de março de 2014

Sopro

"Intervalo
Um sopro que cessa
Libertando
Em seu lugar
O silêncio da alma infinita
A calma
Tranquiliza o desespero
De olhar para dentro
Tão breve e claramente
E reconhecer-se apenas
E tão somente
Isso
Um ser em silêncio dentro de si
Aguardando
Como todos os outros
Um milagre de que não se sabe
Quando
E porque virá
O momento em que seremos
Todos
Libertos
Deste sentir interior
E solitário."


segunda-feira, 10 de março de 2014

Alegria, alegria!

"Alegria incontável
Incontida,
Tremenda!
Mas quem diria
Que viria logo
E que seria tanto
Dentro de mim,
Ao redor de tudo
Alegria
Colorindo os dias que já não bastam
Pra saciar essa vontade de estar
E ser
E viver
Cada segundo com ela."

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Facilidade

"A facilidade com a qual 
Sorri
Seus lábios
O mais lindo dos risos
Rouba-me as forças
E os gestos."


Cartas periodicas

"Eu poderia conviver em paz
Vazio
Como sempre
Sonhador
Como nunca fui
Inabalável diante de um pequeno
Fracasso

Poderia até mesmo sorrir
De desespero ou não
E sentado sozinho para o jantar
Poderia brindar à solidão
Todos os dias
Pela saúde da família
Dos amigos tantos
Dos amores esquecidos
Propositalmente

Periodicamente 
Poderia lhes escrever
À mão
Uma carta
Para saciar meu ego
Ou afastar de mim a solidão
Recorrente

Talvez fosse até mesmo
Possível
Falar
Sobre os efeitos
Desoladores
Dessa tal lucidez

E de como o infinito amor 
À vida
Ironicamente
Enraizou-se 
Em mim."

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Óbvio

"Amei muitas pessoas especiais
Amei-as verdadeiramente o máximo que pude
Ainda que isso tenha sido, por vezes,
Insuficiente ou pouco

Tive amigos dos quais nunca  me esquecerei
Que transcenderam os limites materiais da vida
E se fixaram à minha memória de tal forma
Que não sei se penso por mim ou por eles
Antes de cada próximo passo

E então em alguns dias, diante de tantas figuras reais
Misturadas à ficção arquitetada em minha mente
Sinto no desacelerar do tempo meu coração ardente
E constato o óbvio, que ninguém se atreveu a me contar:
Não vivemos mais no tempo das lembranças."

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

6:00 am

"Talvez exista mesmo muito do que se falar,
Assuntos diversos que nos tomaria tudo
Desse curto espaço de vento entre você e eu

Não obstante deixo a ti um conselho
Prefira o silêncio pequena,
Como limite à verdade que desconhecemos…

Saibamos ser felizes assim mesmo
Feito sonhos interrompidos a esmo
Com o bater da mão fechada à porta
Premeditando o cotidiano sussurro
Da voz a nos alertar:

- São seis da manhã!"

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Audácia

"Audácia é a definição do que não me convém
É a doce sedução dos teus lábios em movimento retilíneo
Dizendo-me o que devo fazer e ser em seguida,
Profetizando o meu futuro arquitetado a mil dedos
Na escuridão dos teus pensamentos ocultos

Não espere tanto,
Por enquanto ainda sou incapaz de saciar o teu desejo de posse
A audácia galopante dos teus sentimentos gananciosos
Dos braços que me arrancam o ar dos pulmões a cada abraço
Destes ouvidos atentos e indiscretos que tanto me constrangem

Confesso que o calor do teu corpo também me acalenta,
Que gosto da maneira violenta com que constrói suas frases
Quando atravessamos os mistérios da noite nos hemisférios mais distantes
Dos corpos entregues à falsa percepção de eternidade
Prestes a acabar com o próximo raiar do dia se revelando à janela

Mas negarei a facilidade com que o teu sorriso me convence,
A quase nula falta que me faz a tua incestuosa presença
Ainda que dela eu seja refém por capricho ou simples necessidade
Não me convém ser omisso diante da verdade exposta

Negarei teus dois olhos negros estáticos frente a mim
O desenho perfeito que delimita a tua existência no universo
A sólida maneira como se desloca de um ponto ao outro
Sempre senhora de si, imponente e majestosa
Audaciosa como este meu desejo de negação
No qual nem mesmo eu acreditarei um dia."

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

O teu regresso

"Ouvi dizer que o teu regresso é certo Que depois de tanto o tempo se resolveu passar E desde então fico a contar estrelas Aguardando impaciente o momento chegar Você despontar pela estrada deserta Rente à mesma cerca do mesmo jardim Contínua como uma tarde morna de primavera Quantos planos eu fiz para esse dia! Renovei a louça, comprei uma toalha nova Plantei um pé de rosas como você me ensinou Mas sem a água e a luz dos teus olhos sobre elas Não tenho certeza de que florescerão a tempo De enfeitar a mesa do café quando você bater à porta."

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Cala-te

"Cala-te maldito!
Cala-te pois já não quero ouvir teu sussurro
Quero me esquecer da tua amarga presença,
Da maneira fugaz como o sangue corre nas tuas veias
Quero me esquecer do teu aspecto vivaz e doentio
Dessa tua mísera existência que tanto me consome
Tornando-me oco por dentro,
Uma figura inumana e vazia como um pote
Ainda que não tão belo, não tão ornamental
Quero assassinar o ímpeto por lembrar-te
Cegar os olhos trêmulos que te admiram à distância
Sempre são e saudável, num eterno carnaval de rua
Folia que tens como marca incontestável da avareza
E da certeza de saber-se razão do meu amor e ódio

Porque não te calas finalmente,
Tens pena do efeito devastador do silêncio?!
Pois fiques tranquilo, não serei eu o próximo
O desequilibrado sociopata,
O esquizofrênico amante
Estigma do teu desprezo

Podes festejar à vontade,
Embebedasse neste vil orgulho que sentes
Fale alto e de risadas através da noite,
Não se esqueça do quão ridículo sou
E não me deixes também esquecer
Faça o que quiseres, lhe digo com veracidade
Mas cala-te ao menos coração revolto
Tudo o que tens deves a mim, como ousas?!
Revogo tua autonomia com convicção
E eu, enquanto senhor de mim, decreto:
À ti, as infalíveis regras da razão!"

Verão

"Não espero respostas tuas
Ainda que o silêncio insista em me dizer certas coisas
E o nosso passado despenque sobre mim a cada passo
Nas esquinas recortadas da mesma cidade
Onde nos amamos tanto ao cair de incertas noites
Em solidão a dois quase perfeita."

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Relato do caboclo

"Depois que passô a ventania pra lá depois da caatinga
Os matuto amedrontado, cambada de cabra froxo
Ó só, tão dizendo que bem no meio da poeirada que formou da terra seca
Surgiu uma morena danada de linda, 
Com uns zóio de jabuticaba madura como nunca se viu
E diz que anda assombrando aquelas banda esquecida de Deus
Que aparece sempre junto com as rara tempestade que São Pedro manda pra lá
Tem gente que diz que já viu uma, outras mais de duas veiz
Tem quem jure com os pé junto que mais de três já viu com certeza
E quem afirme com convicção de burro véio 
Que a tal da morena se veste com uns traje bem acabadinho, sabe?
Que se não fosse assombração daria até dó de vê 
Imagina ocê cumpadre, moça tão distinta naqueles pano sujo cor de terra?!
Outros diz que é de vermeio que ela aparece,
Vermeio nas veste, na boca e um par de zóio preto, preto! 
Zóio de bruxa feiticeira do sertão
Eu sei não viu, sô meio discrente dos boato desse povo
Acho que o sol forte na cuca é que dá essas alucinação
Morena mais bunita que a minha, tem não."

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Sobre nós

"Foram tantos sorrisos soltos
Bailando permanentes noite adentro
Tão certos de si e de nós
Confiantes de que se prolongariam
Através dos dias em nossa memória
Protegidos, acolhidos
Escondidos num canto,
Entre a felicidade e a saudade que certamente viria
Cedo ou tarde
Invadir nosso lar pelas janelas esquecidas abertas
Pela porta da frente escancarada diante de nós
Dois desatentos,
Adormecidos um sobre o outro."