"Choras a ausência, o
horizonte vazio de ideais repetido dia após dia
tuas crenças
fixaram-se em cada fração de existência cotidiana
por isso parece-te
lícito bradar feito um animal raivoso
apontando na multidão
os culpados da desgraça humana
os inimigos da ordem e
da civilidade forjadas a tanto custo
no silêncio de alcovas
colossais,
em tribunais cuja
imensidão desconhecemos completamente.
Negas o pecado que
cometestes,
pois é certo que
ignoravas tão bem a verdade
e que teu porto seguro
sempre foste a virtual hipocrisia
na qual entretêm-se
os homens ao redor do mundo caduco
de onde escrevo a
elegia de uma vida que lhe pertencera outrora.
Tu falavas de um Deus
no qual não cria,
do ser justo e piedoso
que não se via em teus gestos
ou no brilho oculto dos
olhos que me deram a dádiva da escolha,
para enfim discordar
das tuas premissas e certezas
e quiçá acordar-te do
sono secular que mutila a nossa natureza.
Confesso que gostaria
de sentir falta de algo,
de um insignificante
momento, e por isso choro
e nego a cruel possibilidade de que nada tenhas deixado
e nego a cruel possibilidade de que nada tenhas deixado
além de lembranças
para um poema ruim."
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